O Machismo e os seus impactos na saúde mental
- Elienay Brandão
- 23 de set. de 2023
- 4 min de leitura
Atualizado: 29 de set. de 2023

Para compreender o fenômeno do machismo, é essencial explorar como ele se manifesta socialmente e quais os impactos que ele produz na saúde mental. Para iniciar esse diálogo, precisamos falar sobre gênero. O termo "gênero" refere-se a um conceito social e cultural que se relaciona com as expectativas, papéis, comportamentos e normas associados a ser homem, mulher ou outras identidades de gênero. Gênero não deve ser confundido com sexo, que se refere às características biológicas, como genitais e cromossomos, que tradicionalmente têm sido usadas para categorizar as pessoas como masculinas ou femininas. Nem com a sexualidade, que é a forma como as pessoas se relacionam sexualmente ou romanticamente com outras pessoas.
O Machismo é a crença na superioridade do gênero masculino sobre o gênero feminino, subjugando as mulheres e reforçando estereótipos preconceituosos.
Alguns exemplos da manifestação do machismo incluem:
A ideia de que homens são superiores às mulheres em termos de inteligência, habilidades ou liderança.
A tendência de culpar as vítimas de assédio sexual, abuso ou violência doméstica, em vez de responsabilizar os agressores.
A aceitação de que é aceitável pagar às mulheres menos do que aos homens pelo mesmo trabalho e negar a elas oportunidades de liderança.
Acreditar que os homens devem conformar-se estritamente a normas rígidas de masculinidade, o que pode incluir ser emocionalmente reprimido, agressivo ou insensível.
Desprezar ou ridicularizar atividades, interesses ou características considerados "femininos", como cuidados com a família, expressão emocional ou cooperação.
Tais crenças machistas, muitas vezes, começam a ser internalizadas desde as primeiras interações de uma criança com adultos e seus pares, e essa internalização ocorre principalmente através da linguagem, que amplia e perpetua conceitos compartilhados por uma parcela significativa da sociedade. Como, por exemplo, os brinquedos que são direcionados aos meninos e às meninas. Enquanto os meninos crescem com brincadeiras e brinquedos como "Jogar bola", "Brincar de carrinho" e "Jogar videogame", as meninas crescem com brincadeiras e brinquedos que fazem alusão a comportamentos que mulheres adultas desempenham, como "cuidar de um bebê/boneca", "brincar de casinha" e "fazer comidinha", entre outros.
Nesse sentido, as meninas já crescem com a ideia de que ser “mulher” só é possível através desse caminho, casar, ter filhos e cuidar da casa, enquanto os meninos crescem com a liberdade de se divertirem, sem precisar pensar na responsabilidade adulta de ser “homem”.
Já na adolescência, um período de busca pela identidade e aceitação social, é particularmente sensível às influências do machismo. Esse sistema de superioridade pode ter efeitos negativos no desenvolvimento da identidade, já que os adolescentes frequentemente buscam popularidade e temem a rejeição. O machismo, como parte de uma construção histórico-social, gera sofrimento para aqueles que não se conformam com os padrões sociais que o machismo reforça. Um dos resultados que o machismo produz é o bullying, que compartilha semelhanças com o machismo ao envolver relações de poder, onde o agressor exerce controle sobre a vítima e busca ridicularizar, violar e diminuir outra pessoa por não corresponder aos padrões que a sociedade propõe.
Tais comportamentos, ideias e pressões externas podem desencadear sintomas e sofrimentos em várias fases da vida, que incluem o estresse e a ansiedade constantes devido à pressão para se conformar com papéis de gênero tradicionais, bem como a depressão resultante da sensação de desvalorização e da falta de oportunidades. A baixa autoestima também pode ser um efeito, especialmente em homens que não se encaixam nos estereótipos masculinos tradicionais e em mulheres que internalizam ideias negativas de desvalorização sobre si mesmas.
A violência de gênero é um dos fenômenos mais alarmantes do machismo em nossa sociedade e que se manifesta através da violência doméstica e assédio sexual. Tais comportamentos incluem ameaças,agressões físicas, xingamentos, perseguições, assédio verbal, gestos obscenos, toques não consentidos, coerção sexual, entre outras. Violências essas que podem desencadear marcas profundas na saúde mental das vítimas, que quando não são acolhidas e cuidadas por profissionais adequados podem desenvolver traumas e, consequentemente, sintomas e sentimentos de medo, ansiedade, pânico, depressão e até tentativas de suicídio.
As pessoas sob a influência do machismo enfrentam uma pressão constante para se conformarem com padrões de gênero, o que pode levar à repressão de quem realmente são por medo de se expressarem de forma livre e autêntica, resultando em outras manifestações preconceituosas como a homofobia e a transfobia.
O machismo é um sistema aprisionador e profundamente enraizado nas mais diversas culturas e instituições, moldando a forma como interagimos e nos relacionamos. A psicoterapia e a psicologia, como ciência e profissão, desempenham um papel importante e aliado no processo de desconstrução desses preconceitos. Os profissionais de psicologia têm a responsabilidade de questionar esses padrões de gênero, promover o acolhimento e acesso a ajuda profissional.
Na clínica psicológica, a ajuda pode vir através da facilitação do terapeuta na identificação e reconhecimento de como o machismo permeia as relações familiares, escolares e profissionais de cada cliente. Bem como, na busca do autoconhecimento e empoderamento de cada pessoa para que elas possam romper com esses laços e situações que lhes causam sofrimentos.
Em resumo, não há uma solução simples e universal para resolver um problema estrutural em nossa sociedade. É fundamental destacar que não devemos nos restringir a abordar apenas as manifestações mais evidentes do machismo. É necessário adotar uma visão mais abrangente em relação às manifestações mais sutis do machismo na sociedade e como cada discurso, ação ou violência resultante do machismo pode afetar a vida das pessoas. Somente após compreendermos como esse fenômeno impacta cada indivíduo é que podemos buscar ferramentas para enfrentar essas situações e mitigar seus efeitos nocivos.